
Como de costume àquela hora, predominava o amarelo dos ' yellow cabs ', a multidão absorvia a sinfonia de ' honk's ' que se habituara a ter como parte do cenário auditivo, que seria de Nova Iorque sem aquele bambúrrio de buzinadelas como companhia do formigueiro de gentes que encaixava por entre um caleidoscópio de néon's e cíclicos ' walk, don't walk ' que o agarravam e empurravam no ritmo automático das vinte e quatro horas dos dias que nunca acabavam e que a cada hora recomeçavam vindos do nada? Era assim. Nunca ninguém perguntara porquê, mas todo o mundo sabia que era assim.
Viktor, um mais, vindo de lado nenhum para aquele lado global, Viktor sabia também que era assim. Parado no semáforo que lhe regulava a condução, deixara-se embalar por uma viagem de regresso, onde revia a pacata terra que o vira crescer, sonhar e partir, longe iam os tempos de saltos aventureiros de curta duração, as manchetes que desenhara em escondidos sonhos, longe estava o desempoeirado pacato lugar seu, de avenidas poucas e mesas de café muitas, que tanta vida haviam visto desfolhar por entre insuportáveis tardes de calor, regadas e banhadas por infinitas rodadas de impossível cerveja. Viktor estava ali. Sonhava parado. Acordado até. Não ouvia já buzina alguma, não distinguia verdes ou vermelhos, tolhido e quase esmagado na imensidão daquela maré em fúria, naquele ribombar apocalíptico de coisas, sons, gentes, caras, cores de outro mundo. Olhava parvo seu táxi, a que nem o amarelo via ou reconhecia, balbuciava gagas instruções, falhava as manetes, atrapalhava-se em pedais, negava a desistência, coçava a cabeça ... ' Viktor, vai !! ' .. dizia-lhe uma voz, duas, três até, e ele que sim, que ia, que iria, que quereria ir. E Viktor foi. Devagar, num torpor agoniado, mas foi. Chocou com coisas, chocou consigo, limpou armas, sacudiu o pó, enxugou a vista quando esta se lhe turvou. Mas foi! E começou a escrever !! Sem saber se Viktor existia ...