quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

asas, ar e faltas de concentração !!


Saio do Wild Bean Café, ou seja onde habitualmente me sentava aviado de bica, A Bola e cigarro, percorro a zona de abastecimento e pouso o jornal numa improvisada mesa de betão, adaptação de ultima hora que fiz a recipiente recolhedor de lixos do local, abro o jornal, acendo um cigarro e inspiro uma baforada com aquele tesão que se concede ao primeiro da manhã ( nos primeiros/as há pelos vistos um tesãozinho extra !! ). A poucos metros, sentada no banco do condutor, uma potencial utilizadora do ar/água service embrenha-se naquilo que me parece ser o livrinho de instruções da viatura. Chama-me a atenção um inusitado peito, digamos um verdadeiro par de seios, de mamas vá lá, que parece querer libertar-se das grilhetas de uma t'shirt castradora e voar céu afora. Lidas as gordas da 1ª página, onde deslindo se vem a caminho novo craque para o Glorioso, teima a concentração nas letras em fugir, levando-me o olhar a constantes aterragens em macio e convidativo parzorro. Eis senão quando, certamente lidas e entendidas as sinuosas instruções de como pôr ar nos pneus, sai a condutora a fim de iniciar a acção, acocorando-se de costas para a minha improvisada esplanada, posição que protegia de cobiças o generoso decote mas que em contrapartida, coisa de belzebu, alindava o cenário com a visão de uma asa delta, cujo propósito de recolher em privado intimidades de roupas interiores chocava com o resultado de exibir ao ar livre aquele pedaço de tecido que deveria aconchegar partes privadas, dando azo a uma libido que há muito deixara para trás qualquer interesse em novas ou mandados sobre contratações ou offsides! Goradas as tentativas de ultrapassar a página primeira, quedava-me entre umas passas no Marlboro e goles na bica, a fim de reduzir a bandeira de me especar de olho à banda em caminhos de atesoadas viagens de asa delta e ou não só. Quis o destino que a operação de enchimento dos pneumáticos durasse o tempo que daria noutras circunstâncias para mudar ... as quatro rodas, lá se foi a ânsia de novas desportivas, concentração feita em cacos e retalhos, ele era o peito na bola, a bola no peito, as letras que teimavam em escapar aos olhos de atenção pouca, até que... até que se dá o momento da tarefa de reposição de ares concluida, entra e acomoda-se a usuária seguinte, respeitável senhora dos seus cento e muitos quilos, especimen de desejada divisão em duas ou três a roçar os cânones normais, que ainda assim não podia fugir à acocorada posição de abastecimento, desta feita não havia vislumbre de asas nem qualquer outra relação com aviões, a coisa era mais ao nível dos cetáceos, o esforço da tarefa era acompanhado por esgares de atormentar qualquer um, a concentração voltara em peso, nem os semi grunhidos a interompiam ou inflenciavam, voltei os olhos para a página reservada ao meu Benfas, olhei os céus e agradeci, finalmente o Makukula assinou, podia ter sabido cinco minutos mais cedo, a agonia terminava logo, mas quis o divino que ao fim desta outra abrisse caminho, agonia de olhares comilões de peitos oprimidos, asas tipo fio dental a gerarem confabulações que não se coadunam com actualidades do pontapé na bola. Acabei o cigarrito que nem me lembro de em devida concentração ter fumado, atirei a acabada e sorvida bica em copo de plástico no lixo, entrei no carro e lancei um ultimo olhar à paisagem Micheliniana que se contorcia em ' ajoelhares ' para dar aos pneus o ar que com ela em cima por certo tanto precisavam.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

prescrição de medicamentos em dose personalizada ?


' ... O CDS-PP defende hoje no Parlamento que os medicamentos passem a ser prescritos em unidose. O projecto de resolução dos populares pretende evitar o desperdício de fármacos. A indústria farmacêutica está contra a proposta. '

A coisa foi hoje a votação e ... não passou ! Não há unidose para ninguém. Comecemos por tecer alguns considerandos. A proposta surgiu da bancada do PP que, quando apenas tem por função dar ideias, se mostra bastante activo, no seu realizar é que a porca torce o rabo. Teve o apoio do PCP, partido com alguma lógica de raciocinio excepto quando se trata de julgar Estaline e outros algozes inspiradores do seu agrado, do BE e sua bancada que tanto apoia coisas com nexo, como de seguida entra numa de demagogia de anarquias libertadoras de espiritos sãos e livres, tão mais livres se viverem numa de vale tudo, tasse bem e no faith in God please, do PSD, cuja unica lógica é a de prestar a ideia se elaborada em espiritos de seus engenheiros de marcha atrás e de ser contra se vinda do eterno rival do lado de lá, tipo guerra de segunda circular, ainda que tal ideia salve o mundo e o deixe limpinho e arrumado. Foi proposta pelo PS, que é o PSD, versão volta de 360º, ou seja igualzinho mas do contra. Presta se for coisa de engenheiro sem gravata, é contra se vinda da turma laranja.
Discutiram hoje o tema em titulo, prescrição de medicamentos em dose personalizada. A questão era a de encontrar uma solução para evitar que em TODOS os lares deste doente país houvesse um recipiente tipo pilhão onde guardássemos as toneladas de ' comprimidagem' que nos atulham a dispensa e a garagem ao lado da mobilia que também carregamos a vida toda, inutil e no entanto indispensável em dias de mudança. Diria uma criança que se o senhor doutor acha que chegam quatro ou cinco ou dez comprimidos para dar conta e juizo de dor de cabeça ou derivado, aviava-se a coisa nessa matemática, ficava-se bom e ... seguia-se. NÃÃÃÃÕ, clamaram os da industria farmacêutica e mais suas teorias de insegurança, a contrafacção avançaria de imediato, quiça até na FIC ( Feira Internacional de Carcavelos ) veriamos réplicas de Clonix e outras coisas acabadas em 'ix'. Sério ? PHONIX, ou sou mesmo burro ou ... cheira-me a que aquele pessoal não quer largar a mama de tanto dinheiro fodido ao estado e ao doentinho da silva de uma só virada . Tudo parece ser do mais lógico possível, c'um raio isto é um país com tanto engenheiro, será que nem um arranjaria uma lógica universitária para entender um principio com bases matemáticas de origem no 2º ano da escolaridade obrigatória ?
Nããããããão ! Que se fecunde, a coisa chumbou, a malta achou graça ter-se falado nisso, que interessa se ficou tudo na mesma, se os do costume falaram por falar, se uns foram contra porque estavam no governo e interessa manter a pinga dos dinheiros refundidos por esta corja de betoneiros, comprimideiros e outros 'eiros' que entram com o guito em época de circos eleitorais, outros foram a favor porque se estivessem no governo eram contra e assim sempre arranjavam lenha para queimar o parceiro, de que merda se falou então ? Um dia gasto na Gaiola dos Loucos e não se arranja solução para tanto saco filha da puta e cheiinho de aspirinas que não voltamos a usar porque.... se calhar estão estragadas ?? Mas porque, se me dói a cabeça em versão para três comprimiditos tenho de aviar, pagar e guardar caixa de trinta ????? Porque a dor de cabeça é eterna, chegará o dia em que em vez da unidose andamos é em dose non-stop, de aspirinas e antidepressivos, tomamos pilulas para ver se nos tornamos espanhóis ou outra coisa que o valha , mas por favor Deus nosso senhor explica lá a este País que ser-se um pouquinho indignado com tanta merda e pouca vergonha custa menos que ir à missa disfarçado de crente e bater nos filhos às escondidas ! Caramba Senhor, se até em teu Reino a óstia é unica e não cria stocks, dá para passares a mensagem ?

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

deus, num mar marginal ...



Meio da tarde, conduzo pela sempiterna Marginal, coisa com que não nasci e onde não me criei, coisa que entrou assim como um acaso, coisa e trajecto que algo agarrou em mim, seu fez e abraçou. Na Marginal pois, me acontecem coisas que apenas por lá parecem ganhar sua amplitude e profunda essência. Janela aberta, olho à esquerda e perco o olhar em infindas brincadeiras de côr , rebenta a vida num estrondo sensual, traz a maresia sua inimitável receita de cheiros a limo e rocha, iodo vivo e misturado em mágicas mãos cheias de ondas e espumas, entra em cara minha um vento quente de sol apenas meu, toca-me como mão de mãe, beija-me com lábios de amante impossivel, flui o trânsito sem mim, parece pois que sei planar, companhia de gaivota que asas abre em liberdade sempre sonhada, seu grito sem fim voa e ecoa, e pega-me e leva-me naquela paisagem de pura vida, naquele pedaço de gigantes mundos, absorvo o momento que nunca em si desisto, diáriamente descubro em desejos de pessoa unica e pequena. Orgia de sensações sem fim, janela aberta e fechada em segundos de truque divino, olho o céu, por lá dançam riscos e mapas de nuvens que um dia agarrei, o mesmo céu onde sei agora existir e morar um deus de quem sempre desconfiei, sei agora que existes sim, esta explosiva mistura de coisas assim não é obra do bicho homem, falho apenas teu nome, fujo apenas de receitas de orações para este beijo te devolver, sei, porque sei, que tal fraqueza me perdoas, em teu mundo sem escuridões que não a das noites sem lua. Sei que um dia por lá te entenderei.
Faço pisca à direita e saio em direcção a casa. Dia vivido, certeza de que ao adormecer estaremos lá, deuses e mares, marginais e pessoas sós ...

Na pelicula, o momento em que saio, o momento em que, confesso, me apetece parar e ficar !!

sábado, 19 de janeiro de 2008

palavras perdidas ...

Palavras esquecidas
Não vividas nem divididas
Somente nunca tidas
Rebentando como feridas
Indo-se sem ser lidas
Em frases delas despidas
E tanto e tão queridas
Ficaram palavras esquecidas

Vi pois que gritaste
Em janela de teu lugar
Grito rouco indignado
Em gestos de mão dormente
Quieto e mudo marchaste
Traído em teu olhar
Perdido mais um bocado
Do sitio onde eras gente

Palavras pois, palavras
Juntas em letras de acaso
Fujam de bocas fechadas
Conspirem em penas vivas
Tristes perdidas palavras
De tanta morte por atraso
De vontades ignoradas
Da vida de que nos privas

E de cabrão de fingimento
Em merda de assentimento
Foda-se, passou o momento
Em vulgaridades rebento
Repetido arrependimento
De escolhido esquecimento
Em avalanches de vidas
Sem vontades permitidas

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

ensaio sobre .... escrita ao acaso vinda do nada.. e que me diriam a uma coisa tipo ... isto:

Começara a guerra naquela manhã, o movimento no mercado e ruas à volta estava caótico, Adelle ultimava os preparativos da missa anual de angariação de fundos, destinada aos idosos desprotegidos que dependiam da sua paróquia. O tempo ajudava, enviando seus primeiros raios de sol a derreter neves acumuladas em longo e escuro Inverno, as crianças regressavam a casa, enchiam os corredores com seus gritos e correrias enquanto aguardavam pelo lanche onde se deliciariam com as receitas de velhos biscoitos caseiros e trariam peripécias escolares. Naquele fim de tarde a apreensão tomara conta das mulheres da casa, tempos de guerra levavam os homens, traziam apertos e angústias. O costumeiro acender de brasas e lareira trouxe momentos de silêncios preocupados.
- Temos de pensar nos detalhes da Missa. - arriscou Adelle.
- Teremos muitas missas no futuro, não te parece ? - retorquiu Rose, a velha e eterna governanta, parte e espirito daquela casa e familia.
- Pensemos na Missa, Rosie, guerra é assunto de homens, solidão de mulheres e crianças. Pensemos na Missa.
Sabiam as duas da sua importância no governo dos dias por ali, quando partissem maridos e filhos mais velhos, jardineiros, mordomo, motorista e restante gente homem em condições de a Pátria ir defender. Acenderam pois o lume, um pouco de calor invadiu a sala, num repente as chamas cresceram e a encheram com sua luz e seu mundo de coisa quente. Adelle e Rose sentiram o olhar preso, fixo em miragens de negro e incerto futuro, quadro de chamas seria delas em próximo amanhã, umas a alma aquecendo em dias sombrios, outras arrancando pedaços de coração perdidos por sítios que nunca conheceriam.
De regresso à sala onde brincavam e lanchavam os mais pequenos, juntaram-se a histórias entre deliciosos bolinhos, esqueceram momentaneamente as noticias à sua volta. As ruas mantinham a algazarra de corridas, a vila agitava-se em sua nova realidade de anunciadas deserções.
À noite o jantar foi servido na ampla sala de retratos de familia, mesa outrora composta de formalidades e tradições, em sua rigidez de moralidades e silêncios, vida que a vida foi ensinando a modificar, era já por aqueles dias local de acolhedor ambiente, repleto de vivências anciãs e sonhados futuros de aconchegos mais modernos. Correu o repasto em sua normalidade e no entanto acompanhado por um frio fantasma que assustava adultos, passando ao lado de crianças. Servidos os cafés e conhaques na sala contigua, deitada a gente nova, recolhida aos aposentos a criadagem, juntaram-se na sala em volta de um lume que crepitava como em dias de outrora, Adelle, o marido Cedric e seus irmãos Clarence e Everard. Aguardavam Rose que saíra a orientar os arrumos da noite, estranhavam um pouco a demora em preparativos de fim de dia, não imaginavam que a velha e nunca faltada governanta, amiga, irmã, confessora e baú de eternos conselhos estivesse em seus aposentos, sentada num choro que lhe soltava vinte anos de um peito fechado e escondido, onde vivia e morria diáriamente gente que um dia vira como familia sua, de sangue e promessas !
- Rose demora-se, talvez seja melhor guardar conversas para amanhã, disse Adelle, dirigindo-se ao lume e nele deitando um jarro de águas de fim de noite, pondo cobro a cores e quenturas, indicando que aquele era o momento em que desejava ir descansar. Recolheram os irmãos a seus quartos, Cedric aguardou pelo ultimo momento e às boas noites juntou:
- Rose não se despediu, não o estranhas Addi ?
- Rose nunca se despediu Cédric, da guerra que hoje voltou. Tempos de morte que lhe trarão mortes nunca vividas. Talvez que agora chore e nos ensine o caminho ....

PS: nomes gentilmente sacados em ... http://www.behindthename.com/nmc/eng.php, afinal ... pesquisar um pouco é preciso !!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Manel e Maria ...

Havia anos, muitos mesmo dir-se-ia, que Maria e Manel guardavam entre si e para si um segredo, não por cobiças ou vergonhas vãs, apenas porque a incompreensão de suas compreensões assim aconselhava. Mais do que ao céus bradar banalidades, mais do que cartilhas sexistas subscrever e suportar, a dupla encontrara e trilhava, não sem espanto, um caminho que desbravava rumo a almejado destino. Assim posta e caída em sua vida receita de cozinhado caseiro, seguiram M. & M. o inusitado propósito de viver simples em seus corpos e cabeças. Alheados de imposições do ' diz que disse e ouviu dizer ', com naturalidade e interior desejo se lançaram com seu sonho guardado em longo percurso de monotonias consagradas, aqui e ali salpicadas e avivadas com temperos de sentida paixão e desejo. No desfilar contínuo de sóis e luares, deram e receberam almas e intimidades que ousavam sonhar dividir, cuidando os obstáculos de tornear em lugar de os criar. Por opção libertos de cânones e comparações redutoras, deram-se em liberdade e à liberdade de partilhar cheiros e formas, tiques e trejeitos, num espaço que encontraram como seu, de camas, sofás, lavabos e mesas postas. Deste modo, singelo e ingénuo, enfrentaram o enjoativo repetir de despertares resmungados, premiados com cara feliz na eterna e frustrada caminhada junto do rebanho humano onde o Criador os fizera gente. Os anos passavam, a vida também, fraquezas e tropeções enxameavam as existências do par, à medida que rugas e surdezes se apresentavam como novas companheiras. Amarelecidas as paredes e suas fotografias, dentaduras e outros artefactos, branca teimava em restar a esperança de suas mãos saberem entrelaçar. Quantas vezes assim os encontrou o hino nacional das boas noites televisivas, tantas quantas assim os encontrou o raiar de novo dia . Manel e Maria não caminhavam para novos .

Naquela tarde, sentados a receber os últimos raios de sol de um Outono vestido de folhas amareladas e caídas, no velho banco que apadrinhara o momento mágico em que cruzaram , tantos anos idos, seus olhares, tremores, desejos e taquicardias de amor, Manel e Maria agarravam as mãos, mais do que as davam, num calado fim que adivinhavam esperá-los. Doenças de velho haviam levado a mente de um, prantos calados e beijos de coração agarrado o outro. Ao fim daquela tarde , inicio de fria noite, partida avisada do destino levou o coração de Manel num fulminante e derradeiro bater, o de Maria num solitário e solidário desistir.

Na praça, no antigo coreto, mais tarde banca de jornais, nos dias de então um moderno ciberspaço, um aglomerado de bloggers, designação que nunca chegaram a entender, suspirava por fim:

Nós não vos dizíamos que eles acabavam por se separar?

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

relações, ralações e ... correlações !!

Havia anos, muitos mesmo dir-se-ia, que Maria e Manel haviam jurado frente a padre paramentado um amor resistente a saúdes e doenças, riquezas e pobrezas e outros pares de coisas tais que o lar ameaçassem. Tantos anos que, no seu olhar automático em momento de refeição, nem do nome do parceiro se lembravam por vezes. Já nem era o caso da ultima desavença ou desacordo, a coisa desinstalara-se de tal modo que apenas a preguiça de tudo recomeçar impedia que estivessem já recolocados cada um em seu lado. Inevitavelmente o dia chegou em que por causa de coisa nenhuma, se olharam, desentenderam, desatinaram e o destino viraram.
- Foda-se mas o que é que eu vi nesta gaja um dia ? - desabafou alto Manel -
- A mesma merda que eu em ti !! - devolveu Maria .
Duas semanas depois estavam de volta ao ponto de partida e em busca de novo futuro.

Manel, farto de que não lhe fizessem as coisas a seu modo, suspirava pelos tempos da casa materna onde, menino bonito, tinha mesa posta, roupa apanhada e complacência no horário e estado da reentrada. Viuva nesse tempo sua velha mãe, recebeu de volta a coisa mal adestrada , reacendeu chamas de amor sem preço e tratou de tudo compor a gosto do seu Necas. Assim se deu o recomeço por banda do rapaz, tudo nos conformes, nada fora do eixo que girava em torno do seu nariz. Perdoava à velha senhora os roupões na sala, as máscaras de argila, um buço por vezes sentido em beijos de boa noite. Mais ainda, não o incomodava a eterna passeata pelos saldos, nem o pedido para passeio domingueiro. Aquilo era amor puro, casamento ideal, descontando as cenas de cama, incestos e decoro afastavam desde logo aquilo que levava um ano num casamento dos chamados completos e abençoados com fotos para mostar aos amigos ! E, assim como assim, marchava a empregada da vizinha, a filha do merceeiro e uma ou outra amante de taximetro ligado, fintando o destino na sua implacável sina de trazer enjoos a cama repetida.

Maria dava agora graças à sua liberdade de mulher completa. Livre e independente como não se sentia desde que terminara o liceu e se vira desobrigada de exames nacionais, podia agora dar largas a tudo o que era programa cultural e não só, de bolas e amigos com grades de cerveja se vira livre, dormia descansada sem ressonos de justo à beira. Na parte das carências, virava-se bem. Um salto aqui e ali, ao restaurante ou bar de acertada escolha, permitiam-lhe escolher garanhão de toca e foge, boa cama e sala incólume. Em dias de chuva ou menor disposição, resolvia os ataques de subitos calores com artefactos emprestados pela velha amiga evoluida e liberal. No que toca à imaginação, esse campo trouxera-lhe um prazer e surpresa nunca dantes imaginados, com a vantagem de, após lavadas as mãos, por aí se quedarem exigências de carinhos, atenções e jantares na mesa. Parte de marido sustentada a água e sabão, que mais poderia querer ? E sobrava tempo para leituras e investidas pelo até então desdenhado mundo da cultura, para nem falar da sentida e orgulhosa independência.

Passados que foram alguns anos mais, que para surpresa dos dois continuavam a desfilar como no tempo da dividida escravatura de votos e sentimentos, Maria e Manel deparavam-se com nova situação de saturações ... Não se estranhou que acabassem por em nova etapa se iniciarem. Por ironia do destino, Manel conheceu nova Maria, Maria conheceu novo Manel, e num ápice se concederam novas oportunidades! Atentos a tudo o que de errado correra em seus passados de sonho e pesadelo, sofisticadas exigências acautelavam a não repetição de traumas dos precipitados votos anteriores. Cuidadas observações ao mais pequeno detalhe, evitavam invasões a espaços duramente conquistados, de liberdades e respeitos individuais. O tempo gasto em fulminantes contrataques ao mais pequeno sinal de regresso à longa noite de enjoos era visto como aposta e investimento na clarificação das regras de novo amor. Com estes cuidados, conseguiu o par M & M manter seus novos casórios por tempo quase igual ao anterior. Não contavam porém que a corrosão da novidade pudesse voltar a atacar e instalar-se, minando os seus equilibrios de ambições românticas e liberdades individuais. As separações, denominação menos deprimente e legalmente menos burocrática, de novo os lançaram para lufadas de ar livre que tanto sentiam esfumado. Quis a ironia, essa puta de ironia que sabemos existir mas com a qual muitas vezes nos recusamos a lidar, que Manel e Maria se cruzassem amiude no mesmo espaço onde davam vara larga a liberdades e ocupações de tempo que de novo os brindavam. Sabendo que a teimosia de um e orgulho de outro impossibilitaria qualquer reaproximação, quis o Divino a coisa resolvida e forçou o caminho pelo lado mais fraco e animal, injectando ambos com um tesão tal que a chegada a arfar ao apartamento mais à mão , rápido deu lugar a um resfolegar suado e sem pruridos que haveria de terminar num gemido partilhado com uma sinceridade nunca anteriormente vivida. Mais que um olhar culpado e de dividido arrependimento, quiseram forças ocultas que uma segunda seguida fosse dada, fenómeno a pedir divinas explicações naquele par de eternos e jurados incompreendidos.
Manel não acendeu um cigarro logo de seguida, Maria não saiu despachada a desinfectar partes intimas, ficaram a olhar a nesga de mar que lhes parecia imensa através daquela janela que tanto encarecera o apartamento na sua aquisição. Em silêncio se perguntaram se quereriam uma segunda, primeira sincera, oportunidade. Levantaram-se e sairam calados, cuidando de não se despedir.

No dia seguinte, Manel voltou a cruzar o velho parque da cidade, deparou com Maria sentada no mesmo banco em frente ao coreto, hoje banca de jornais, a ela se dirigiu e as horas lhe perguntou ..
- É mesmo isso que quer, saber as horas ?
- Não, queria mesmo sentar-me aqui e conhecê-la, sair um dia quem sabe ! Pode ser assim ?

Falaram sério e de dentro, saíram uns dias depois, apaixonados acabaram. De novo e pela primeira vez. E nunca mais se perguntaram pelas horas sabidas, pois que tal nada de novo lhes traria !

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

raio de sol !

Haverá em dias de guerra
Timidos raios de sol ?
Saberá o sujo louco
Não estar só na caminhada ?
Pensarão os deuses da terra
Sua obra inacabada ?
Saberão todos os velhos
Que não há dias iguais ?

E em que caminhos se perde
O momento das coisas
Em que dias terão espreitado
Nossos bocados de vida?
Será escuro o mundo cego
Ou de palavras sabidas ?
Será misterioso segredo
A força de vidas sofridas ?

E penso que mais queria
Ler e ter grito perfeito
Rezar ao deus do dia
Oração vinda do peito
Na guerra velha o louco via
Mãos de deuses sem jeito
E mudo silêncio vivia
Timido raio de sol perfeito

sábado, 12 de janeiro de 2008

domingo, 13 janeiro, 15 horas !!


É amanhã, às 15 horas, na Fábrica Braço de Prata, sala Nietzsche !

É conversa entre amigos, à volta de uma paixão comum. Ler, escrever, ouvir coisas sobre esta parte do nosso caminho. Falar-se-á do Vidas Simples, das dificuldades em editar e expor neste País, do novo caminho blogueiro . Vão estar o Zé, o Arnaldo, o Art e eu.

E muitos mais, espero !!

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

O parvo !!!

Malabarista palhaço
De banha vendedor
De cobra, no caso
Coisinha de brilho baço
De barganha comprador
Cérebro no raso

Velha e coisa vista
Lida, rida, esquecida
Eterno rebanho dormente
Que o palhaço não desista
De certa e garantida
Maralha morta e desistente

Do parvo se tem saudade
Como saudades de gente
E de escritos de quem sabia
Que fim, que puta de maldade
Não guardar Gil Vicente
E seus risos da alarvia

Volta poeta, homem, escritor
Desse Clube de Gentes
Nunca mortos, nem em tela
E relembra-nos por favor
O triste fim de fracos crentes
Quem viu vida e fugiu dela

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

janelas ...

São centenas
De janelas sem pessoas
São pequenas
As nuvens que sobrevoas
São gangrenas
Que te matam sem doer
São tristezas
Que vês sem entender

Mil palavras e escritos
Esquecidos
E por caminhos malditos
Corridos
Mundos assim proscritos
Exauridos
Mil palavras e gritos
Rasgados

Sopra fraquezas do medo
Como quem sente vontade
Não deixes partir cedo
Um olhar sem idade
Cheira, toca nas folhas
Que sentirás um dia tuas
E saberás então que olhas
As janelas com pessoas

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

hino ... à puta da estupidez !!!

' ... A Junta de Freguesia de Vale de Salgueiro, no concelho de Mirandela, anunciou no seu site oficial autorizar as crianças a fumarem entre 5 e 6 de Janeiro, cumprindo a tradição da Festa dos Reis em Vale Salgueiro, poucos dias. '

Segundo a edição desta segunda-feira do jornal Público, que cita algumas crianças da região, uma criança de oito anos admitiu ter fumado 23 cigarros nestes dois dias. Outra, de 11 anos, também citada pela mesma publicação, afirma ter fumado dois cigarros, e esperava que o pai lhe oferecesse mais tabaco.Num outro testemunho, também citado pelo Público, uma criança de dez anos afirma ter fumado dez cigarros e afirma ter tido algumas tonturas quando experimentou fumar um charuto.De acordo com a tradição da Festa dos Reis, em Vale de Salgueiro, todas as crianças acima dos cinco anos estão autorizadas a fumar por ocasião desta celebração.

Não ando muito posteiro, menos ainda na crónica do dia a dia, tipo análise e critica social, primeiro porque não sou critico de porra nenhuma, pelo menos em termos que me ache merecedor de ser lido, entendido e seguido ou talvez não! Também, verdade seja dita, cada um sabe de si, deus nosso senhor de todos e que ninguém se queixe, deuses há muitos e para variadissimos gostos, em caso de indecisões e aflições dá para se encostar à maralha caminhante, dar o bracinho à turba e fingir-se ser parte de coisa alguma ... Adiante !
Em plena Marginal, passeio que aconselho pela beleza da paisagem com tanto mar, que diáriamente faço a fim de deixar o ' meu mais novo ', expressãozinha mediocre mas doravante perdoada perante a coisa acima noticiada, oiço na rádio uma sintese de noticia que me vi obrigado a confirmar, tal era a javardice da coisa. Em três penadas, é exactamente aquilo que abre este post, fala da tradição das crianças fumarem em dia de Festa dos Reis !!! Em dia de quê ? De festa ? Ou da mais pura e refinada imbecilidade ? A coisa passa-se em Vale Salgueiro, bem sei, mas nem a toponimia própria de sitio escondido e sem futuro de arromba justifica a barbárie do inicio ao ritual que levará , daqui a meia duzia de anos, a que sejam os meninos escorraçados para fumarem em grutas de nicotino-dependentes, tal anda a coisa em termos de leis, para nem falar dos colaterais da coisa, tão em bold escarrapachados nos pacotinhos do produto. Pior .... tudo isto com o patrocinio da Junta de Freguesia ? Junta ? Só se for Junta de Anormais e Estropiados Cerebrais, certamente eleitos por seus pares em dia de eleições, romarias, bruxas e outras tradições ! Depois de ler isto, pergunto-me em que raio de constelação de alucinados foi este País buscar tradições ... Pensar que a anterior que caiu em debate publico se prendia com o tesão voyeurista de pessoas que se masturbavam intelectualmente com o sangue e morte de um bicho cornudo e indefeso, certamente candidatos a sentarem-se um dia em plena 2ª circular e, de pila de fora, esfregarem-se perante o inevitável acidente diário pr'áquelas bandas que não poucas vezes espirra um pouco de tripas também ... pensar nisso ganha agora toda a ilógica imaginável, logo agora que largámos o desprezo pela animalada e o passámos ' rápido e em força ' , tal como a salazarista ida para as colónias, pela entrega à bicharada de um molho de crianças que têm o azar, o filha da puta do azar de nascer por aqueles lados. E porque não, num assomo de arrojo de macho, pôr a canalha a mamar uns ' penalties ' também, uns charros em tradição de pré puberdade e uma seringada coletiva aquando do aparecimento dos primeiros pintelhos ? Pintelhos sim, pois pelos púbicos é linguajar que nem em décadas aprenderão a soletrar e entender.
Não sei se me espante, se me congratule por em tempos de previsão me ter habituado a sobreviver neste canto do salve-se quem puder ... Mas esta porra de merda de ideia não é crime público ? Ou vale tudo em nome da tradição ? Se assim fôr, passem a bater-se maravilhadas punhetas em frente das gajas boas com quem nos cruzamos na rua, façamo-lo com preceito e método, sempre à mesma hora do dia e encaixemos a coisa à laia de tradição também. O que, atendendo a tanto casamento entre primos nos velhos Reis que deram origem e continuidade a este cabrão de canto sem juizo, não é sequer de estranhar, é mesmo coisa para ser aceite com o eterno encolher de ombros e virada da discussão para assuntos de bola e de apaneleirados programas de TV. Entendo agora onde já vai a depauperada opinião pública e miserável consciência social, desde que os Marcos e Zé's se tornaram noticia e capas de revista !
Repararam que este post leva a sua dose de palavreado a ser sujeito a ' parental control '... Tentei fazê-lo sem recorrer a tão vernácula verborreia ... mas admito a fraqueza de ter falhado redondamente.

Aproveito e inicio uma tradiçãozinha que considero muito minha e que proponho como candidata a nacional ... Neste dia da tal Festa de Reis , viro-me para os adultos da tal de Vila Salgueiro e sugiro-lhes:

Se fossem mas era mamar na pila, metessem um dedo no cu e gostassem, substituiam o toque à prostata, de que por certo nunca uso fizeram pois semelhante órgão deve ocupar-vos a zona destinada ao cérebro....

Quanto ao País em si ... nunca mais me fodam a cabeça a dizer que isto ou aquilo não se faz. Tal como fumar numa bomba da BP, com bica e ' A Bola ' pela frente.

Entendido ??

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

três olhares sobre um dia !



Esta é a simples história de um simples dia na companhia de coisas boas da vida que entendem juntar-se no mesmo tempo e lugar. Um dia de céu limpo, uma cidade chamada Nova Iorque e duas pessoas, Zé e Artur que tive a sorte de ver entrar na minha vida. Tudo se passou, nada se passou e o fim do dia chegou com aquela sensação de que há momentos que valem a pena.


Ferry Street

Cinco da manhã, novaiorquinas bem sei mas cinco da manhã de qualquer modo, o Zé interrompia o seu sono povoado por ressonos justificados e sempre negados, a caminho da eterna visita matinal que se faz à casa de banho quando o sono desaparece. Habituado a despertares de sono ligeiro de pai de criança de quatro anos, vi ali interrompido o meu trajecto do aconchego, sabia terminado o repouso e iniciado o dia que longa caminhada prometia. Entre cerimónias mais de preguiça que de outra coisa, num zapping à procura de novas nas primárias do Ohio que teimava em esbarrar nas ultimas, ou ausência delas, de rapariga perdida na montanha, o som da televisão seria por certo suficiente para acordar a vizinhança de três portas para cada lado do corredor, mas assim entendia necessário o meu parceiro de quarto. Após dois duches e a cerimónia do trajar a roupagem adequada a oito graus negativos, partimos em direcção à mui lusa Ferry Street, onde as torradas, croissants e bolas de Berlim substituem os tão americano-apreciados ovos sunnyside up, mai la catrefada de salsichas e baked beans. Tomado o mata-bicho e por ideia do Zé, tomámos o rumo de uns armazéns que por ali havia , sempre dava para fazer hora até abrir a loja de electrónica dos portugueses onde se pretendia comprar uma camera digital, reposição de stock a fim de esquecer o triste episódio em que o mais velho dos dois, num acesso de alemãozice, houvera deixado no táxi que na véspera fizera a corrida até ao NJ Gardens das compras inevitáveis, de rouparia e não só, marcas finas preços de pobre! Feita a coisa e no trajecto para o hotel e hora marcada com o terceiro compincha, - ‘ espera aí temos de entrar ali se queres mesmo comprar boxers e peúgas ao preço não da água, não da uva mijona, mas da década de 70 ‘. Hesitações e gracejos à parte, lá entrámos, historieta antiga sobre preços daquele local, eis senão quando a coisa se mantém, é um fartar vilanagem, quais trajes interiores qual nada, fomo-nos aos casacos e casacões, blusões anti frio, anti tudo, camisa de ar coçado a condizer com o meu gosto a atirar para o desmazelo, toca a pagar a pechincha, - ‘espera aí levo um cachecol também ... ‘ ah cachecol ainda bem que falas nisso deixei o meu por aí algures’ ... ‘ ai Zé esse alemão anda a dar-te, olha só tenho uma luva eu, que é feito do par? ‘ ... Lá estava, esquecida num molho de roupa entre provas, mau isto chega cedo, aos quarenta e cinco, na farmácia pedimos dose do remédio para os dois!


O resto do dia ...

Agasalhados e juntos os três, percorrido o curto trajecto até ao Path , meio comboio meio metro, nada que saber ... direitos à 34 St ainda que com mudanças de linha, foto para aqui e ali, tudo documentado não fosse a coisa acabar em post. Aterrados em plena Grande Maçã, tira luva, saca e acende cigarro, procura de um Starbucks, rotina que agradava ao par de mais novos, o ajuizado não fumava mas parava também, atravessa-se para o lado de lá e ..

‘ - Vocês sabem de quem é esta estátua?.... Pois é, assim, saiu a primeira conversa em torno de algo de jeito, Artur sabia atentos os amigos, carregou no detalhe da pessoa homenageada, pessoal isto merece foto alvitrei, - ‘ que sim! ‘ - acenaram os dois, tira luva e ajeita o cabelo, quem o tem e é ralinho ainda por cima, escolhido o transeunte que eternizaria o momento, chegada a hora de decidir o rumo.

- ‘ Então, subimos a 5ª até a o Central ?- andamos por lá, de charrete segundo o Artur, de bicicleta propôs o Zé, de patins disse eu, ideias muitas, frio também, ficámo-nos pela caminhada permanentemente interrompida para registo fotográfico. Na esquina com a 36 St. entrámos a fim de comer qualquer coisa mais, num muito agradável W Café, género de tem tudo, comida japonesa incluída. Sentados e quentinhos, mais umas fotos, lá aquecemos o corpo , o estômago e a alma, a onda do sitio era boa, dez dólares a cada um, nada mau, almoço em NY ao preço de lanche em posto da BP.
No Central Park, seguiu-se o arrazoado costumeiro de chapa a contra luz a abraçar lago gelado e arranha-céus, passeio tranquilo por entre uma paisagem que nos entra adentro para ficar e acalmar, são as gentes e as coisas, a natureza e seus habitantes que ali nos envolvem e atiram para para longe da vizinha e esquadrinhada NY no alcatrão.

Passaram os minutos e as horas sem que tal constituísse curiosidade ou preocupação, meia volta e descemos até Times Square, o jogo de luzes estava de encomenda, aquele inicio de fim de tarde puxava a cafés, cigarros, fotos e passeio na multidão, fascinante aquela cidade de mundo inteiro, abraça-nos a alma e joga-nos no espaço onde únicos nos tornamos partes de um todo, como se os pensamentos se elevassem e nos arrumassem peças e ideias. Na companhia de dois non-sense parceiros que aguentam provocação permanente e dão troco, passei uma tarde que nem vi correr e arrancámos então em direcção à 3ª com a não sei quantas, em busca do tal de Milon, restaurante de comida do Bangladesh que me reservava surpresa falada desde a véspera. Entrámos e saímos no Subway , divergiam as opiniões entre Subway e Yellow Cab .... divergiam eles digo eu .. por mim estava tudo bem, tanto me dava, sabia lá qual era melhor se nem vislumbrava a lonjura do destino. Decidimos pelos carris, na bicha dos bilhetes estava um sul americano a ser gritado e de lado olhado por uma gorda afroamericana com ar de inteligência de juntar água e arrogância de frequentadora do McDonald’s, chegou a nossa vez e cuidei que marchávamos a gritos também, . - ‘ three, please ‘ disse o Zé, veio um só, ‘ ... mas eu disse three. Mum ...’ – ‘ pass it three times ‘ , she said com o mesmo ar enjoado com que devia conviver desde a nascença ! Lá fomos ao torniquete, passámos o cartão de um lado e outro, e mais um e mais outro, de pernas para o ar, dentes para cima, dentes para baixo e pôrra de movimento nenhum naquele filhinho da puta de bracinho metálico. Atrás e ao lado era um fartar de gente a seguir, todos menos os três da vida airada, eu já me ria com o ar com que olhávamos o bilhete três em um ... até que alguém se lembrou de chamar uma colega da trombuda, veio a contra gosto e a rosnar superioridades, mas Deus não dorme, menos ainda naquela cidade, e a autoridadezinha fardada, tipo meio policia meio merda nenhuma, passou o cartão como quem mostra como se enche um balão e .... f.....-se à grande e à franciú, népia de abrir o ‘ mãe da foca ‘ do gate. Conseguiu à sétima, deu ainda para um esgar de superioridade em tons de amarelo mui fraquito, passaram dois e o terceiro, eu claro, lá marrou de novo com a bosta do guarda mecânico. Passei pela porta para inválidos e bagagens grandes, por onde certamente passariam as funcionárias desajudantes, fosse o caso de irem passear também . Da 42 St a Downtown foi o do costume, cruzar olhares e adivinhar percursos e vidas de gente que veio do mundo, ficou no mundo e do mundo não me parece que vá sair !

Chegados perto do destino, o Zé e o Artur não quiseram deixar de me brindar com a visita a Washington Square e seu Campus universitário, mais ainda uma livraria que segundo o Artur não podia deixar de me mostrar. A praça é de facto bonita e ficou em foto, a livraria levou o Artur em busca de um quarteirão que, sendo por ali mesmo, acabou por não dar a cara, enquanto o cigarro e as fotos do costume, agora em montra de interiores peças de roupa feminina me ocupavam e ao Zé ! Chegados ao restaurante entendi a surpresa da coisa. É como entrar numa árvore de Natal de um lar na Amadora ou Fogueteiro. A profusão de luzes e o papel de parede escolhido transporta-nos para uma sexta dimensão, como se jantássemos num filme dos anos setenta acerca da psicadelia. Comeu-se bem e o do costume, o picante trata de enganar qualquer prazo que desafie a ASAE local, todos bem apertadinhos e aconchegados, aproveitámos para dar ao dia o tom intelecto-social e debatemos questões sindicais e outras que tais. Antes da conta, aterra-me à frente uma bola de gelado com uma vela, toca uma música de carrinhos de choque, alinhei na coisa que pensei tradicional e bati palmas e mais palmas, até perceber que se festejava o meu aniversário, assim disse o Zé ao empregado, assim as pessoas do restaurante me desejaram um dia especialmente feliz, agradeci sem desmentir a efeméride e atribui a coisa não ao alemão mas ao facto de ser bom ter e estar com amigos avariados dos cornos !

Regressámos pelos eternos caminhos de Cab’s e Sub’s, chegámos ao hotel perto das vinte e três horas deles, quatro da matina nossas, fumei um ultimo cigarro e deixei o frio do dia para trás. Enquanto fazia um ultimo e obrigatório zapping pelos canais de noticias e desporto, o sono atacou-me. Fechei as contas do dia e inclui-o no grupo dos que valeu a pena e muito. Como vale também ter amigos assim.

Obrigado Zé dos Elevados, obrigado Artur do Todo !!
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quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

repescado da semana ... this post !

e a 3 de março de 2007 escreveu-se neste canto :

momento de volta .....





... e como te disse, sempre estiveste por aqui, nada te afasta da vida ... e aqui estás ao meu lado quando casei ... aqui estás quando acordo e me lembro dos teus ultimos beijos de passarinho.... porque numa lição de amor não há fim !! Ainda guardo o cheiro do teu pó de arroz e o sabor dos teus pastéis de bacalhau .... no mesmo sitio onde guardo aquela tarde de sol em silêncio... no meu coração, Avó Licas !!!

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

naquele dia ... !

Sentado no velho cadeirão de sempre, de gente minha que se foi e ficou , em momentos que teimaram em se agarrar naquele espaço de misteriosos cheiros e danças de saudade, pendurados em velhas paredes que me acenam e prendem, me guardaram em viagens de longinquos brilhos e canções de vozes ternas e sumidas, contemplo a eterna paisagem de mar que nunca dali saiu, me soube esperar num repetido vaivém de teimosa vida, abraçando e fustigando aquele recanto que nosso fizera, onde me seduzira numa fúria de sentidos e sabores, de ensinamentos de velho amigo sem rosto. Levanto-me e abro a janela, velha de séculos, range num tom que me lembra outras noites e manhãs, aspiro com ânsia a lufada de ar carregada da mais pura nostalgia, ganho forças esquecidas em lugares onde me perdi, fecho os olhos e preparo o reencontro marcado com o mundo que jurei não deixar. Lá fora, bem ao longe na vila que me acolheu em pequeno, há muito que estrelejam os foguetes anunciadores da chegada de esperanças novas, vãs e cansadas, juradas e desejadas por magotes de braços ao alto, de eternos e voláteis abraços, uma vez mais não compareci, invisivel mão me puxou para o recanto de segredos que na magia da crença me devolviam bocado meu sempre sonhado, por vezes encontrado e no entanto nunca ficado !
A maré seguia seu curso, insensível a votos e desejos, levava e trazia numa dança apenas sua, de força e caminho sabido, rebentava forte no rochedo que a acolhia e seu se tornava, amante fugidia e de sempre, trazia em salpicos todo o ar que necessitava eu ali, abandonado em seus braços de mãe, olhos fechados e mãos quentes entrelaçadas e dadas a lume de fogueira viva, calor e cor unicos por ali, mundo de deuses desenhados por mãos de menino, mãos leves e finas de sábias rugas. Escutando a musica das águas e ventos, lendo no céu as histórias que nunca alguém escrevera, deixei-me então embalar na viagem que anos atrás soubera descobrir, a porta se abriu e entraram as gentes, todas as gentes que meu nome souberam guardar, meu cheiro sentir, meu sabor levar. E eram velhinhos antigos, meninos idos e perdidos em mundos de gente grande, eram abraços de pureza, colos que embalavam sonhos e esperanças, nomes com letras não apagadas, e entraram e ficaram, dançaram também aquela noite, miraram mar seu também, avivaram o lume e o pó sacudiram numa orgia de dias vividos, novos segredos me contaram, lágrimas me levaram, beijos trocámos, mãos nos tocámos.
Durou toda a noite até que o sol me invadiu em cerimonioso despertar, sabia que aquele acordar era de volta, a lugares mais sós, sem fúrias de mar nem calores e lumes de magia.
Levantei-me, fechei a janela, desci a longa ladeira de regresso ao cais, entrei no barco e despedi-me daquele lugar meu num ultimo olhar. Sabia-os lá, juntos como sempre, esperando sem juras uma resposta:
- Não, nada prometi de novo amigos ... apenas que sentirei a vossa falta um ano mais. E vão e voltem, o mesmo farei eu !

O barqueiro, o velho e nunca esquecido barqueiro, velejou então, de volta à cidade naquele dia de ano novo ! Finda a viagem despediu-se com o seu aperto de mão de gente grande que sempre conheci. Trocámos o olhar e desejámos a unica coisa que sabíamos querer. Não me faltes para o ano, até lá guardo-te algures !