terça-feira, 22 de março de 2011

secreta ambição


Bebo um café e dirijo-me à caixa para o pagar. O café soube-me bem, acompanhei-o de um cigarro enquanto usufruí de um sol que parece querer regressar.
Pago com uma nota de cinco euros, a quantia de 0,65 €.
Aposto comigo mesmo que a senhora me irá perguntar se não tenho ' mais pequeno ' ( certamente referindo-se ao dinheiro apresentado para pagamento ).
Aguardo uns segundos e ...

- Não tem mais pequeno ?

Pondero algumas respostas:
- Tenho, mas resolvi testar a capacidade de reacção da caixa !
- Tenho, mas adoro andar com os bolsos cheios de ' cascalho ' e passo a vida a beber cafés e a pagar com notas, por vezes até de 20 ou mesmo 100 €.
- Tenho, mas com 48 anos de idade nunca imaginei que me fosse pedir uma coisa dessas!
- A sério ? Para quê ?

Resolvo pela simplicidade.

- Não, não tenho!

A senhora abre a caixa registadora e reparo que existirão por ali cerca de vinte ou trinta euros de moedas, em trocos!
Pergunto:
- Mas porque queria mais pequeno ? ( o montante com que paguei, claro ).
- Porque posso precisar de trocos !
- Para quê?
- Para dar a um cliente que necessite!

Eu era o tal cliente que necessitava, pensei. Eu era a oportunidade da senhora brilhar, dando o troco sem a eterna questão que a banalizava. Eu era o tal.
O amontoado de ' moedâme ' que habitava a caixa, deixava entender que ... ou alguém havia ido trocar ao banco uma nota das boas préviamente, a fim de capacitar o estabelecimento à ciclópica tarefa de dar um troco ... ou a diligente senhora havia anteriormente martirizado uma série de utilizadores do serviço com a questão da existência, por parte dos mesmos, da posse ou não de maiores pequenezas.

Recebi o troco, a demasia como aprendi em pequeno, fui-me acendendo outro cigarro e pensando. Talvez a senhora fosse apenas ambiciosa, talvez apenas desejasse o momento orgásmico do troco sem pergunta numa situação tipo ' golo fora da área ' ... quereria certamente encarar um cliente a pagar um ' carioca ' ( cinco cêntimos menos que a costumeira ' bica ' ), sacando de um ' travel cheque ' no valor de 10 000 €. Ao que ela, impante, reagiria sem pestanejar ou questões métricas, virando a caixa de pernas para o ar, fazendo ressoar o tilintar mágico de quem possui trocos até que a Lua volte a ter o tamanho da de há uns dias!

Talvez fosse isso apenas. Talvez!