quinta-feira, 18 de setembro de 2008

surdezes e bigodes alarves!

Cai o vermelho e páro no semáforo. Na ocupação da espera olho em frente para o trânsito que iria fluir na minha perpendicular. Iria .. digo bem. Um velho Renault Super 5, velho de vinte anos ou mais, queda-se imóvel no primeirinho lugar da fila que deveria arrancar, ao volante faz-lhe jus em antiguidade ultrapassada a condutora, senhora de setentas e muitos ou mais, palpitando por baixo para não errar por largo. Por detrás dos seus óculos debate-se certamente sobre a cor que emana do poste iluminado e seu significado, hesita por entre lembrar-se como mover o veículo ou talvez quem era e o que fazia ela por ali. Atrás, bem atrás de si, Mercedes creme, modelo de finais do século passado, condutor, ou melhor motorista, de bigode, ar impaciente e incrédulo, buzina na mão, mão na buzina, esquecendo por certo o quanto agride a natureza e irrita o mundo pelo simples facto de existir com aquele arzinho e feitio de idiota encartado. A senhora, a idosa personagem que naquele momento barra o avanço e impede o progresso do mundinho do cavalheiro de unha avantajada, permanece e evolui na continuidade das suas dúvidas, sobre o que fará ela por ali, responsável pelo fluir do trânsito e no entanto sem a colaboração do veículo que a não compreende. A surdez e total alheamento permitem-lhe passar ao lado dos cada vez mais ajavardados e gesticulados modos do 'homem de neanderthal' que a buzinadelas pretende despoletar a física do movimento alheio. Debalde!
Cai o verde e tenho de arrancar, nunca tanto desejei o prolongamento de um sinal encarnado, ' arranca pai ' grita-me o Kuka, arranco pois, não sem pena de deixar para trás aquele momento de Fellini, de surdas antiguidades e ruidosas alarvidades de bigode e marquise em casa certamente. Passo rente ao cenário, envio beijo fantasma à querida surda, vomito mentalmente no banco traseiro do taxista e sigo ao destino, esqueço a parelha.
Amanhã passo por lá de novo, com um pouquinho de sorte ainda estarão por lá ...

4 comentários:

Isis disse...

Nunca gostei de condutores de Mercedes, todos parecem obedecer a um certo padrão. Contudo esse beijo fantasma à querida surda e o vomito mentalmente no banco traseiro fazem com que repense a minha opinião.

Vitor disse...

…O homem de neanderthal de bigodes alarves? Parece-me que já o vi por aí algures, mas ia jurar que era de cro-magnon.Se calhar fiz confusão! ;-))

Cati disse...

Rais partam os taxistas!!!
Belo episódio querido, sempre bem relatado, nunca me deixas desiludida! :D

Beijoca*

Tânia Pinto disse...

Não sou taxista... Nem tão pouco conduzo um Mercedes... Mas realmente tenho que deixar de ser tão impaciente... É que sinceramente que me vi de unha avantajada e bigode de mão na buzina... Tenho que deixar de apitar às pessoas pah...