sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
banco de mãos com cores ...
Sentado por ali mesmo ao lado, estranhava Marito a concentração com que o velho mantinha as mãos fechadas. Não que o incomodasse, mas admitia que ao fim de algum tempo a curiosidade lhe aumentara sem fim, estava decidido a desvendar o mistério nem que para tal tivesse de o olhar nos olhos e metralhar a questão. Ao fim da tarde, depois de um desfiar de horas em que a coisa se mantinha e de novas nada, ganhou coragem e sem mais atalhos disparou:
- Que tão bem guardas velho, em mãos fechadas de guardar tesouros?
Com a mesma serenidade com que passara a tarde num silêncio sem respostas, virou-se para o petiz e retorquiu:
- Quererás pequeno, que o segredo das minhas mãos voe para ti?
- Mas, de que se trata afinal?
- São cores ... como te chamas mesmo?
- Mário ... mas podes chamar-me Marito ...
- Pois Marito.. são as cores que aprendi na vida .. em todos os dias que acordei e vivi.
- Como assim ?
Abrindo as mão, deixou o velho escapar um vermelho que de imediato coloriu o ar em volta !
- Este era a companhia de dias de raiva, de timidez, de calores indesejados ... era assim como uma companhia estranha e tantas vezes presente.
- Repete .. por favor ..
Da outra mão agora aberta saiu um verde, explicado por dias de esperança, por dias de fraqueza enjoada, por dias de olhar o mar também.
Marito estava preso naquela magia de cores falantes, de azuis de céu em dias bons, de cinzentos em dias de apetecer coisa alguma, os castanhos alaranjados dos dias de outono, pretos de tristeza, de lutos e contestações, os brancos de pureza e de lividez também, amarelos em dias de chinesices, desfiou o rosário de cores que lembrara ter aprendido, para todos tinha o seu companheiro de banco um momento, um dia e disposição, uma lembrança de coisas sentidas ... Por mais que rebuscasse em seu caleidoscópio de menino que não desiste, lá vinha um dia com memória, de coisa feita e passada, sentida como feita num mundo de mãos com cor.
- Mas ... e que fazias ... que farias ... se ...
- Se .. ?
- Deixa ... nada ... se o dia aparecesse sem cor ... assim como se fosses tu a pintá- lo?
- Isso, querido amigo recente ... isso era nos dias de coração ... de viver dentro de mim, onde se é transparente...
Marito quedou-se mudo em tal resposta, sabia que assim era com ele, que apenas fora de mão e de mãos se encontrava no coração ... sonhava caminhos e percorria desafios.
Levantou o olhar e quis abraçar o velho sábio. Espantado, mudo até ... sentiu o branco de lividez, o âmbar de espanto, vermelho de raiva e algum verde de esperança ... o banco estava agora desocupado ... guardou a esperança que a partida conquista de troca de palavras soubesse andar por ali, para quando um dia cuidasse entender a transparência escrita nas mãos em cores de coração seu. Olhou o banco uma última vez e estranhou-o, de novo lhe pareceu um simples e público banco.
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11 comentários:
Sempre inspirado, John
Com as cores das emoções se pintam arco-íris da vida ... aqui pespontadas de palavras soltas bordadas a carmesim.
Em dias transparentes o bordado renova-se, novas palavras, novas cores se juntam enchendo as mãos de sonho. Ao abrirem-se voam borboletas de espanto como nunca ninguém viu pois nasceram ali mesmo, no casulo do coração encerrado em punho fechado ...
Tenho um “Velho”a quem chamo de ídolo, que as tuas palavras me relembraram as cores da sua vida…!
Ah…e na volta o cisne era mesmo de cor escura :-)
A materialização das cores em vivências e emoções sentidas...
A vida num quadro....
Beijo
Graça
As minhas "mãos de velho" soltaram um suave azul quando li as emoções das tuas cores.
XR: é cada comment cada obra-prima ... trocamos de lugar ? ;-)
vitor: e o velho ... é como o Natal ... quem um homem quer !!
graça: visto assim .. well, até parece coisa erudita ..
GG: valeu a pena então .. cores & mãos !!
Quando alguém deixa de segurar as escadas, e passa ele a subi-la perante as dificuldades iminentes…estamos perante um verdadeiro amigo, que em troca de nada nos põe ao seu nível.
John,
as cores com que pinto o meu Arco-Íris são talvez as mesmas, apenas espalhadas de cores diferentes ... tu é que já por lá passaste deixando uma continuação imprevista que se diria ter nascido da mesma paleta.
;)
E o nome do velhote era o quê?
Mr Dyrup?
Sr Robbialac??
;o)
FELIZ NATAL, Redjan! Seja como for que tu o entendas!
Abraço grande!
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