terça-feira, 9 de setembro de 2008

ali, nos degraus da solidão!



Eram tempos diferentes aqueles, de paz e acalmia, dias sem a angústia do entardecer, de passeio por entre as árvores que abraçavam o horizonte, nos acenavam em suaves vénias, eram dias de seguida vontade, onde tantos minutos contavam, todos os minutos mexiam e sabiam ter significado, os nomes pertenciam-nos, a praia ali quieta, tão quieta, como se se rendesse ao Inverno e suas cores de aconchegada gente que se embrulhava em mantos de sonhos com e sem chuva, lembras-te Avô? Aqueles eram tempos sem cheiro a pólvora e morte, sem rasto de mãos sujas e pobres, de fome arrastada em filas de ninguém mais, como era boa a luz que a janela deixava entrar, os pingos que martelavam parapeitos e desenhavam arabescos fugazes, o cheiro a madeira húmida, pão quente e batata doce. Não havia nada que para trás tivesse deixado, correra como correm os loucos atrás daquela meninice em que sabia serem seus os tempos, e não chegara, perto sequer, daqueles amanheceres de dias com cor. Não havia ninguém mais, haviam partido, na viagem louca do medo, no arrasto surreal da escura melodia da guerra, troavam os sons, mortas as batidas das gotas de água. Olhavam-se o velho e a criança, sabiam-se no fim, não há espaço para os fracos quando o homem se acobarda em seus silêncios, vazios de quereres ou palavras. Morreram quietos, abraçados talvez, ali nos degraus da solidão, sem frio nem sonhos mais. Assim os encontraram os regressados ao passado, deixado e abandonado. A guerra acabara, de vez para quem nunca a vira sua ou em seu ser quisera.

9 comentários:

Vitor disse...

...De histórias sentidas e contadas se fazem hinos de bem escrever…é o caso!

Artur Guilherme Carvalho disse...

As boas malhas literárias voltam a ocupar este espaço. BOM; bom. Muuuito bom mesmo. Humano, sentido, arrancado das entranhas da alma. Fixi!
ARTUR

redjan disse...

Dasssss... estava aqui sossegado, nem vos sabia por aí ...

Tx Vitor e Art !! Mesmo!

blimunda sete luas disse...

Que bonito, Red!

redjan disse...

Wow.... Bli por aqui?

Curioso, andava em casa tua, a ler sobre pudins ... ;-)

Thanksssss

José Ceitil disse...

Belo texto, amigo.

Unknown disse...

Muito bom...parabéns!

Anônimo disse...

Está de uma beleza suave, quase desistente como a "praia rendida ao Inverno", este teu "ali, nos degraus da solidão!"
E o teu Migas, como vai?
Um grande abraço!

Tânia Pinto disse...

Sinto-me sempre um bocado estúpida ao comentar este tipo de post porque acho que a esvrita é uma forma de expressão tão pessoal quanto qualquer outra arte... Mas devo dizer que está muito bom :)